Reflexões sobre uma educação que talvez virá

O mundo passa por mudanças mais intensas do que esperávamos ou desejávamos, e com ele todo o conjunto do sistema educacional. Essa não é uma realidade que afeta apenas uma cidade ou país, mas todo o conjunto de pessoas que querem ou precisam aprender o que quer que seja. A limitação do acesso ao emprego tem feito muitas pessoas repensarem suas carreiras, e tomarem a importante decisão de voltarem a estudar. Ao mesmo tempo, aqueles que ainda nem possuem uma carreira a ser mudada, sofrem com uma incerteza a mais, que se junta às tradicionais questões existenciais de quem se torna um jovem ingressando no mercado de trabalho. Há aí o ambiente perfeito para repensarmos nosso sistema educacional, e aparentemente é o que tem sido feito.
Observando o que tem-se falado, imagino que o educador do futuro próximo deverá ter certas características para ganhar as mentes e corações de seus alunos. Deverá, sem dúvidas, ser um gênio da informática, para criar conteúdos recheados de pirotecnia e que possam competir por atenção com smartphones, laptops e outras telas dotadas de um mundo paralelo chamado internet. Tendo em vista que a maior parte de nós ainda não conseguiu sequer adaptar-se a ferramentas simples, como aplicativos de chamada por vídeo, sem ter problemas para ligar a câmera e o microfone na hora certa (e desligá-los quando conveniente), acredito que a possibilidade de que isso aconteça seja remota.
Nesse novo modelo de educação à distância, algo em que tenho pensado é sobre a hipocrisia digital a que submetemos nossas crianças e adolescentes. Exigimos que eles sentem-se em frente a um computador durante pelo menos cinco horas por dia, escutando e prestando atenção a conteúdos absolutamente desinteressantes, enquanto nós, durante as reuniões de trabalho em que utilizamos as mesmas ferramentas que eles, evitamos ligar a câmera para podermos fazer “outras coisas em paralelo” – leia-se: fazer algo de mais interessante, ligado ao trabalho ou não – sem sermos flagrados. Isso gera inevitavelmente situações constrangedoras quando, por exemplo, alguém deve repetir uma pergunta porque claramente não estavámos prestando atenção.
A leitura que faço dessa situação é: o problema não são as telas que tornaram difícil nossa participação, seja ela ativa ou passiva, em nosso próprio processo educacional. A questão é que, em sala de aula, não tínhamos a opção de escapar quando queríamos, enquanto agora isso tornou-se tão fácil quanto apertar um botão. Por isso, acredito que modernizar os meios de transmissão de um mesmo conjunto de informações em nada nos ajudará a obter a longo prazo o resultado social desejado, apenas contribuirá para gerar indivíduos tristes e solitários ao perceberem que, além de terem passado longos anos de suas vidas esforçando-se para obter informações de pouca utilidade, também não puderam criar os laços afetivos com seus colegas que enfrentavam a mesma situação.
Qual rumo deve tomar a educação?
Seria muita pretenção de minha parte dizer que posso oferecer uma solução mágica para um problema tão complexo, portanto não é isso que pretendo fazer. Quero compartilhar apenas reflexões que venho feito, e talvez encontrar outras pessoas que também se interessem pelo assunto para discutir esse tema.
Para mim, o problema maior que enfrentamos não é a falência do modelo tradicional de ensino, usando um quadro negro e um giz, e muito menos o fato de que os aluno de hoje em dia tem que passar horas em frente ao computador vencendo as distrações. A raiz do problema está em algo muito mais profundo: a maioria do que se ensina nas escolas é quase inútil, sobretudo da forma como é ensinado.
Claro, é muito importante aprender línguas, matemática, geografia, história, ciências, etc. No entanto, de alguma forma conseguimos tornar essas disciplinas tão interessantes em algo insuportável, desconectado da realidade dos alunos, e que eles sabem de antemão que, assim que passarem no maldito vestibular, farão questão de nunca mais se lembrar.
Por outro lado, não ensinamos absolutamente nada sobre temas fundamentais para a vida, tais como política, economia, alimentação saudável, primeiros socorros, fundamentos básicos de computação, entre outros. Pior: quando tentamos ensinar arte, o fazemos de uma forma em que os alunos criam uma repulsa e até mesmo um deboche por essa área que expressa o que o ser humano consegue fazer de melhor. Acredito, talvez de maneira inocente, que quando começarmos a ensinar algo realmente de valor para formarmos cidadãos melhores, os próprios alunos se fascinarão pelo que poderão almejar e alcançar, e nenhum método mirabolante de ensino será necessário.
Nada disso que estou escrevendo aqui é novo, são discussões já feitas e refeitas por diversas pessoas, então talvez o que me incomode de verdade é que desde muito tempo pouca coisa mudou. Poderíamos aproveitar esse momento de reflexão para pensarmos também em agir. O problema é que fomos educados nesse mesmo sistema ao qual estou criticando e, apesar de no papel as idéias fluírem maravilhosamente bem, a prática não é nosso forte.